quarta-feira, 4 de maio de 2011

She's leaving home


Chegou e me puxou pela mão,
Falando de mansinho no meu ouvido,
Fazendo carinho.
Todo brejeiro me diz:
Hoje não é dia de poesia.


PS: The poet (1911), Chagall. Já aqui aparece mais uma vez no pictórico desligado das vanguardas, e no aparente infantilismo de seus temas. Sua pintura é lírica e onírica e elementos seus se entrelaçam ao Surrealismo, mas pertence a vanguarda Russa.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Helano, meu bem


Contenha-se Helano, contenha-se! Explicar o mundo? Desvendar Proust? E Deus em átomos? (a propósito acordei de novo hoje pensando se Deus não existia mesmo). Explique-me antes seu último verso, confuso não, significados é de que preciso e que sem eles não poderei qualifica-lo. Explica-me benzinho tua limitação antes. É limite Helano. Há limites. E não me venha com a estapafúrdia explicação de que o limite está no corpo, não na mente. Tua capacidade já não explica tudo. Dorme queridinho. Amanhã tu terás de mim café com leite, pão de mel, língua, contato corporal, um cachorro barulhento (Ando com saudades de balbúrdia de cachorros desde que a minha morreu) e explicações a me dar. Que diabos significa seu último verso? E sim, finalizas amanhã as tuas últimas linhas do artigo, a revista esta quase pronta! O Florius me exigiu cobrar de ti! Porque és arredio, e só comigo és doce. Penso que o Florius seja o nosso limite. Como alcança-lo? Isso não desvendas não é seu metidinho de merda.

Um beijo doce,

Sua Laura.


PS: Queria morar numa dessas! Biblioteca de Sendai, destruída pelo tsuname de 2011, segundo alguns relatos a cidade está coberta por água.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Queridinha,


Confesso que sua carta me preocupa parece que andas abatidíssima, destroçada. É meu bem, a vida não é lá tão divertida assim. E o vazio parece de certa forma nos tomar uma vez por outra na vida, mesmo que haja o mundo a nossas mãos. Meu conselho, se você já não o estivesse cumprindo, seria a reclusão. É o melhor em dias assim. Como a esse padecer não conheço outro remédio só me resta minha querida fazer-me todo ouvidos para você. É, o que você me contou me enojou em demasia, é duma leviandade, e uma pura falta de caratismo, e digo mais, é fingir-se no sense. Sabe que ando muito enojado com essa farsa do no sense. Duma parlapatice enternecedora para os medíocres, não para nós queridinha, que prezamos pela transparência. É que vemos muito além e que tão tolos pensam que nos enganam, não passam de vermes. Mas no fim, penso que foi pra você algo de muito bom e, sobretudo, positivo, você não deve se prender a algo que sempre lhe incomodou, que lhe causava qualquer ponta de mal estar, energias negativas (você realmente acredita que em tudo há energias? Isso é uma nova religião? Ao menos um dogma? Perdoe-me a comicidade inevitável). Querida você tem de abrir é estrada larga, franca, e sinceridade que é sempre você. Ou antes espontaneidade, mãos dadas com a verdade, siga sempre esse lema. Parece-me as vezes que você é de qualquer forma dotada por alguma força superior que te protege de coisas assim, você já reparou isso? Mas talvez seja só as suas “energias”, perdoe-me a gazação, foi espontaneidade! Então podemos resumir nesse acontecimento por você a mim relatado um final feliz. Ao menos você não vai se exasperar mais com tanta tolice, nem tanta bobagem. E isso me levou queridinha a pensar que você deveria e já iniciar uma limpeza, jogar fora essas criaturas que de certa forma não lhe parece acrescentar nada. Chega de conveniências, de submissão, a hora é de renovação. Novo ciclo começa. Não acredito que você anda jogando cartas? É tão ignominioso! Detestavelmente odioso pra mim tua vulgaridade criatura, mas vá lá se você acredita e bate o pé confirmando que sim, quem sou eu de mais humilde pra acusar-te. Mas não deixo de pensares que és muito boba! Mas enfim, adoro-te sempre!

Amanhã discutiremos teus contos. Que diabos andas fazendo nesse gênero hein? Não sei por que insistes em escrever o que não tens talento. És romancista queridinha, deixe de preguiça, tome fôlego e escreva romances! Sua tendência é realmente o romance. E não adianta tentar se defender dizendo que discutir gêneros literários é retorquice besta. Por que hei de falar sobre isso até a exaustão. Quanto aos capítulos que me enviastes, falo-te na próxima missiva, mas previno-te que me causaram pasmo. Há mais maturidade, e ao mesmo tempo uma sutileza em Estela que há muito eu não lia. Gostei deles, dou-te então o conselho de seguires em frente, estás no caminho certo.

Quanto a sua vida, é tempo de colher o que se plantou meu bem. Ando mal-criado minha queridinha, precisamos de um café, um abraço e um bom livro, não, digo, um bom romance, como o do Gabriel. Precisamos no encontrar para discuti-lo!

Um beijo querido,

Seu amigo Florius.

PS: Gostou das margaridas? E das pitangas? São ambas do meu jardim.



PS: Van Gogh.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Meu limão, meu limoeiro


Meu limão, meu limoeiro
Meu pé de jacarandá
Uma vez tin-do-lelê
Outra vez tin-do-lalá

Morena, minha morena
Corpo de linha torcida
Queira deus você não seja
Perdição da minha vida

Meu limão, meu limoeiro
Meu pé de jacarandá
Uma vez tin-do-lelê
Outra vez tin-do-lalá

Quem tem amores não dorme
Nem de noite, nem de dia
Dá tantas voltas na cama
Como peixe n´água fria

Meu limão, meu limoeiro
Meu pé de jacarandá
Uma vez tin-do-lelê
Outra vez tin-do-lalá

A folhinha do alecrim
Cheira mais quando pisada
Há muita gente que é assim,
Quer mais bem se desprezada

Meu limão, meu limoeiro
Meu pé de jacarandá
Uma vez tin-do-lelê
Outra vez tin-do-lalá.

(Cantiga popular que fez bem demais ao meu coração)


Lá em casa tinha um quintal, tinha flores, e amores
Tinha um jacaré, um galo garnizé, e uma pata com fé.
E tinha um pé de limão
E chá da tarde, nas porcelanas de boneca,
com folhas do meu limoeiro.
Era tarde ainda de fim de inverno,
Sabe que vez em quando chove ô mariazinha!
Que caia chuva gostosa, já de tardizinha...
Brilhava, não castigava e era bem fininho
Parecia orvalho de árvore.
E se fazia pulinhos nas poças, dona moça!
Brincadeira de enchurrada dá gargalhada.
Hora do banho
Perfume
Vestido engomado
Fita vermelha na cabeça.
Menina senta à mesa comportada!
Caldeirão de sopa quentinha
Pão de alho
Carne assada.
Queijo amanteigado...
E eu era feliz e não sabia...



Ps: Brincadeira de crianças, Heitor dos prazeres.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Dia iraniano em vidinha nouvelle vague


Citei ainda ontem o Drummond como paliativo para o meu atual bloqueio literário. Estou sem conseguir escrever nada. E eu que quero tanto escrever algo. Por necessidade e pela própria falta dela, por desatenção e por ansiedade, aqui arbitro minha incapacidade com as palavras. Sai-te vazio desgraçado. Salta as amarras de teu encosto e pulas cá dessa alma. Pensei, quando acordei, em escrever qualquer coisa sobre o dia de hoje. Mas hoje não passou senão de um filme iraniano. Um tédio e eu não entendi foi nada. Mas se me perguntas qualquer reflexão do dia de hoje, é uma ânsia afinal pelo que não sei se chega. Pedaço de pedra sem historia. Pus-me a refletir, e sabe do que, penso que isso é tipo coisa que tem necessidade própria, impõem movimento, a contrapelo, por contrapeso, de qualquer que fosse a vontade inconsciente. Mas do que? Pus-me a refletir. As coisas andam inconseqüentes, nada revelam, nada tramam, fábula tranqüila. Tédio iraniano. Percebo que não percebo qualquer leve movimento pra movimentos intranqüilos. E nada está em minhas mãos. Ops.

Mas é que tenho pavor de retrospectivas, filmes se repetindo de um ano pavoroso. Credo! O dia era o elemento pra um texto. O ano, bem o ano guardo-o em um buraco sem fim, desses que não se vê em filmes iranianos pra meu desagrado. E vejam caros leitores, se todo o texto não se tornou confuso, pequeno, mesquinho. Confesso estou um pavor na literatura. Ah, é como tenho sempre dito, meus queridinhos, essa hedionda madrasta, leia-se a literatura, um dia me mata!


PS: É que é justo acabar o ano com a minha última e recente paixão em arte, Henri Cartier Bresson. Pela Genialidade, pelo não uso do flash, pelo charme do preto e branco, e da rigorosa composição de imagem.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Palavra amor


Não facilite com a palavra amor.
Não a jogue no espaço, bolha de sabão.
Não se inebrie com seu engalanado som.
Não a empregue sem razão acima de toda a razão (é raro).
Não brinque, não experimente, não cometa a loucura sem
remissão de espalhar aos quatro ventos do mundo essa palavra.
que é toda sigilo e nudez, perfeição e exílio na terra.
Não a pronuncie.


[Carlos Drummond de Andrade, "o seu santo nome", em Corpo (1984)].


PS: Mais um pouco de Brensson, pra acabar o ano em P&B.

sábado, 27 de novembro de 2010

Se um dia de chuva eu for e de cara com o inevitável dia azul me deparar


Quem diz que não regressa de uma morte?
E em queda? Quem cai com a manteiga pra cima?
E as asas do inevitável nunca se abrem em vôo de queda!
Aceita o convite do vago.
O solo do infinito é um passo.
Lisonjeios enchem o vão
Um baque
Um sonho
Uma queda
De um vôo alto.
Inevitável a morte regressar
A manteiga e o convite.
É só um passo,
Sim, eu aceito.


PS: Zurich, 1966, Henry cartier Bresson.